Viajar pelo norte e centro de Moçambique é como abrir um livro de páginas vivas, onde cada cheiro, cada sabor e cada rosto contam histórias silenciosas de um povo profundamente ligado à terra e às águas que o cercam. Entre essas histórias, poucas são tão marcantes e autênticas quanto a do capenta.
Quem visita as margens do Lago Niassa ou passeia pelos rios generosos do centro do país, logo percebe que o capenta não é apenas um peixe. É símbolo, é rotina, é sobrevivência e festa ao mesmo tempo. Pequeno no tamanho, mas carregado de um sabor intenso, o capenta é pescado em grandes cardumes, especialmente ao entardecer, quando as águas espelham o céu em tons de fogo e ouro.
O processo tradicional de secagem ao sol é uma herança que atravessa gerações. Nas aldeias, o capenta é cuidadosamente estendido em esteiras ou redes improvisadas, enquanto as crianças brincam ao redor e os mais velhos conversam sobre as mudanças do tempo e das marés. Este peixe seco ganha, assim, uma textura única, crocante por fora, macia por dentro, e um aroma forte que anuncia sua presença mesmo antes de chegar à panela.
Em Moçambique, comer capenta não é apenas uma refeição; é uma experiência de pertencimento. Servido com a inseparável xima, a papa espessa de milho, e acompanhado de couve refogada ou molho picante, o capenta convida o viajante a sentar, partilhar e ouvir. Cada garfada traz o sabor profundo das águas doces, mas também o sal das lágrimas, das histórias, das alegrias simples e da resiliência de um povo que faz da simplicidade sua maior riqueza.
Ao sentar-se à mesa onde o capenta é servido, o turista não apenas alimenta o corpo. Alimenta também a alma, mergulhando na essência de uma Moçambique que, muitas vezes, passa despercebida nos roteiros turísticos tradicionais, mas que pulsa forte nas aldeias ribeirinhas, nos mercados populares, nas mãos calejadas dos pescadores.
Mais do que um prato típico, o capenta é uma porta de entrada para um Moçambique autêntico, onde a gastronomia, a cultura e a vida cotidiana se entrelaçam em harmonia. Provar o capenta é aceitar o convite de uma terra que oferece mais do que paisagens: oferece histórias, sabores e experiências que ficam gravadas na memória de quem se permite viver intensamente cada detalhe.
Para o viajante curioso, aberto ao inesperado, o capenta será sempre mais do que um prato. Será lembrança, será conversa, será pedaço vivo da alma moçambicana.